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Governador do MT veta projeto que barrava construção de usinas no Rio Cuiabá

Reprodução da Reportagem de Michael Esquer da plataforma ((o)) Eco.

Foto: Michael Esquer

Considerado uma das principais veias de abastecimento do Pantanal, o curso d’água é alvo de um complexo de seis pequenas centrais hidrelétricas. Parlamentares organizam reversão do veto

O governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (União Brasil-MT), vetou integralmente o projeto que pretendia proibir a construção de usinas hidrelétricas em toda a extensão do Rio Cuiabá – considerado uma das principais veias de abastecimento do Pantanal. A decisão foi publicada nesta segunda-feira (4), no Diário Oficial do Estado.

Aprovado em maio deste ano na Assembleia Legislativo de Mato Grosso (ALMT), o Projeto de Lei nº 957/2019 tinha entre os seus principais objetivos barrar a aprovação de um complexo de seis pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). O empreendimento é proposto pela Maturati Participações S.A. e Meta Serviços e Projetos LTDA.  

O PL foi aprovado em meio a um movimento protagonizado por ribeirinhos, parlamentares, organizações socioambientais e diversos outros setores da sociedade, que denunciaram as ameaças dos empreendimentos para o estoque pesqueiro e sustentabilidade hídrica do bioma pantaneiro.

Em 2021, o governador já havia chamado a lei de “absurdo”. No veto, Mauro Mendes disse que sua decisão justifica-se por parecer da Procuradoria Geral do Estado (PGE), emitido a seu pedido, que apontou inconstitucionalidade da lei por interferir em competências que seriam da União e do Poder Executivo, como a legislação de recursos hídricos e a proteção ambiental.

“Interfere na competência privativa da União para legislar sobre águas, violação ao art. 22, IV da CF (Constituição Federal), bem como, na competência material para explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão aproveitamento energético dos cursos de água; instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos  e  definir  critérios  de  outorga  de  direitos  de  seu uso”, diz um trecho do veto.

Derrubada do veto 

“Esse veto é muito preocupante e mostra que o atual governo do Mato Grosso não está pensando em nenhum momento na preservação das atividades econômicas como a pesca e a observação de fauna no bioma”, disse ao ((o))eco Gustavo Figueirôa, biólogo e diretor da SOS Pantanal, organização que integra o Observatório Pantanal – coalizão composta por 43 instituições socioambientais atuantes na Bacia do Alto Paraguai (BAP) no Brasil, Bolívia e Paraguai.

Segundo Figueirôa, como o projeto foi aprovado na ALMT, a expectativa é que a própria Casa de Leis possa derrubar o veto. Alcides Faria, diretor-executivo da Ecoa, outra organização integrante do Observatório Pantanal, afirma que o próximo passo, agora, é convencer os deputados estaduais a reverter a decisão. 

“A região tem nas águas a base de sua vida tão biodiversa, mas também da economia no que tange o trabalho e renda. A pesca na nas suas várias modalidades, por exemplo, será profundamente afetada pelo impedimento da passagem dos peixes para reprodução. Ela é a atividade que mais gera trabalho e renda no Pantanal. Agora o trabalho é convencer a ALMT para derrubar o veto do governador”, afirma Faria. 

((o))eco conversou com o autor do PL, deputado estadual Wilson Santos (PSD-MT), que disse que os parlamentares devem se organizar para derrubar o veto do chefe do Executivo Estadual. “Tivemos 12 votos para aprovar, agora precisaremos de 13 para derrubar o veto”, disse Santos, referindo-se a necessidade de maioria absoluta dos deputados da Casa de Leis para a reversão do veto. 

Sobre as usinas 

As usinas estão previstas para serem instaladas em um trecho de 190 km do rio em áreas de seis municípios mato-grossenses: Cuiabá, Várzea Grande, Jangada, Nobres, Acorizal e Rosário Oeste. A Bacia do Alto Paraguai (BAP) já tem 47 hidrelétricas em operação e mais de 130 projetos de PCHs que miram rios que, assim como o Cuiabá, atuam na regulação dos ciclos de cheia e vazante do Pantanal. 

Estudo de impacto de hidrelétricas na BAP, feito pela Agência Nacional de Águas (ANA), caracteriza o rio como zona vermelha para implantação de empreendimentos hidrelétricos, principalmente pelo papel importante de manutenção do bioma pantaneiro. 

A investigação também concluiu que 89% dos peixes do Rio Cuiabá são de piracema, ou seja, são migradores, que transitam entre o curso d’água e o Pantanal. O rio é ainda responsável pela produção do maior número diário de ovos de peixes migradores durante a piracema entre todos os cursos d’água da BAP.

Conforme especialistas consultados por ((o))eco, a construção de seis usinas no Rio Cuiabá pode interromper o fluxo de peixes entre o curso d’água e o Pantanal, reter em até 90% o transporte de sedimentos para o bioma, acelerar o processo de erosão das margens do rio e impactar a cadeia econômica das cidades que dependem da pesca na região. 

Judicialização de lei municipal 

Em junho, a Associação Brasileira de Energia Limpa (Abragel) protocolou uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) contra a Prefeitura de Cuiabá e a Câmara Municipal de Cuiabá (CMC), por conta da aprovação de outro PL que também dispunha sobre a proibição de construção de hidrelétricas no Rio Cuiabá (dentro da área compreendida no território da capital do MT): o PL nº 6.766/2022

De autoria do vereador Eduardo Magalhães (Republicanos), a matéria foi aprovada em dezembro de 2021 e, em janeiro deste ano, foi sancionada pelo Prefeito da cidade, Emanuel Pinheiro (MDB). Na ação, a Abragel argumentou que o PL desrespeita preceitos fundamentais ao usurpar diversas competências da União. Dentre elas, a associação alega que o rio Cuiabá é bem de domínio da União. 

A Abragel disse que a lei municipal, em tese, teria produzido inconstitucionalidades formais e materiais por usurpar o parágrafo VI do artigo 22º da Constituição Federal de 1988 – dispositivo prevê que compete privativamente à União a legislação sobre águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão. 

A ADPF ainda será analisada pelo relator, o ministro do Supremo Edson Fachin, que requereu manifestações da CMC, Prefeitura de Cuiabá e Ministério de Minas e Energias.

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